O Maçom e o ego Junguiano
Uma reflexão Junguiana
Por exemplo, citamos o fato de que os maçons têm como um dos seus grandes objetivos o “vencer o ego”, como dizemos em vários momentos de nossas cerimônias. Mas afinal de contas de que ego nós maçons estamos falando quando dizemos que queremos dominá-lo, vencê-lo? Será que estamos falando do ego de Jung, ou falando do ego de Freud?
Inicialmente, temos que separar esses dois conceitos de ego, pois são completamente diferentes e suscitam interpretações muito diversas tanto em si mesmos, quanto para com os objetivos da Maçonaria. Por uma questão de simplicidade, não vamos tocar na visão do ego de Freud, até porque entendemos ser esta, de fato, a visão mais comum na Maçonaria. Acredito que pode contribuir mais se tentarmos, neste momento, entender o conceito de Jung e buscar relacioná-lo. Pretendo que ao final possamos entender que, apesar da Maçonaria usar o conceito de Freud para o ego, o restante dos ensinamentos maçônicos estão mais relacionados aos conceitos de Jung.
Para começar, vamos apresentar alguns conceitos básicos do que é a mente humana dentro da visão junguiana. Temos que deixar claro que os conceitos serão apresentados aqui de maneira extremamente simplificada, talvez até simplista. Assim como o ser humano, a psicologia Junguiana é ampla e complexa. Aqui abordaremos esses conceitos apenas de forma a podermos relacioná-los a nossa filosofia e prática maçônica. A fim de propiciar uma ampliação de estudo para aqueles que desejarem, o título de cada conceito terá um link para um filme ou site que o desenvolve um pouco mais.
O Self: Na psicologia Junguiana o self é entendido como unificação do consciente e do inconsciente constituindo, de certa forma, o todo da pessoa. O selfie, traduzido como o si mesmo, nasce conosco e constitui a essência daquilo que somos na integralidade (consciente e inconscientemente).
A Persona: Na visão junguiana, a persona é uma faceta, ou como nome infere, um personagem, apresentado pelo ego ao mundo externo, a fim de melhor se adaptar à uma situação ou demanda social.
A sombra: A sombra é um dos conceitos da psicologia Junguiana mais discutidos e amplos.
Encerrado nosso período de conceitos básicos, vamos relacionar tudo isso com o que nós temos e vivemos dentro da Maçonaria.
De cara, vemos que ego na Maçonaria é usado no mesmo sentido que na palavra “egoísta”. Este não é o sentido usado por Jung. Para ele o ego é a nossa projeção consciente no mundo e logo não é necessariamente bom ou ruim. Desta forma, se falarmos de dominar ou mesmo destruir o ego, usado neste sentido, isto seria desastroso. Alguém sem um ego ou um ego fraco no sentido Junguiano, nos falaria de uma pessoa sem uma percepção do seu próprio eu, sem controle, sem mediação entre seu inconsciente e o mundo; logo falaríamos de uma pessoa doente.
Se por este lado, a psicologia de Jung se afasta do uso na Maçonaria, por outro o próprio desenho que representa o ego e o selfie dizem muito em relação à nossa filosofia. Se no sentido usado por Jung o ego (o ponto no centro do círculo) é o foco de projeção do selfie (o círculo completo) no mundo, para nós o ponto central é o grande arquiteto que emana o mundo, que é o grande círculo. Vejam aqui se repetindo a sabedoria hermética (Assim é em cima como embaixo), Jung usou como modelo para sua visualização da psiquê humana o mesmo modelo de formação do próprio universo segundo várias correntes místicas; inclusive a nossa.
Todavia, os paralelos não se encerram por aí. Para Jung, a comunicação entre o ego e o self se dá através de uma “ponte”, que ele chama de eixo ego-selfie. Como os conteúdos mais profundos do selfie não podem chegar ao consciente em sua maneira bruta, Jung nos diz que essa comunicação acontece somente a partir de símbolos. Todos nós já ouvimos falar que a Maçonaria é "Um sistema peculiar de moralidade baseado em alegorias e ilustrado por símbolos". Assim sendo, podemos perceber que a Maçonaria aplica a psicologia um Junguiana ao instrumentar seus iniciados com uma simbologia, que facilitará o acesso ao seu selfie e a sabedoria do inconsciente coletivo que lá se encontra.
A questão é que a imperfeição é intrínseca do ser humano. Assim, acreditarmos que essa persona, esta máscara, é aquilo que de fato somos significa nos estagnar. Para seguirmos nos aperfeiçoando, precisamos enxergar o nosso ego como realmente somos, para poder seguir trabalhando e melhorando a nós mesmos de fato. Neste sentido todos os aventais e medalhas são um verdadeiro perigo, pois podem nos fazer acreditar que somos aquela persona, quando na verdade somos aquilo que está por trás. É sobre este ego escondido atrás da persona que o malho e o cinzel devem trabalhar.
Já o conceito de sombra nos traz um item ainda mais importante. Uma vez que a sombra é inconsciente e plasma tudo aquilo que não aceitamos ser, é nela que estão as características que certamente mais mereceriam nosso trabalho. A questão é exatamente que ela é inconsciente, negamos a nós mesmos a mera existência delas. Dessa forma, não há como trabalhar e evoluir sem, de algum modo, ter contato com nossa própria sombra. Este contato é por definição difícil e doloroso, mas certamente é o grande degrau para um efetivo crescimento pessoal.
Concluindo, podemos ver que a Maçonaria usa o conceito de ego concebido por Freud, pois o encara como algo negativo, como fonte de nossas paixões e objetivo de nosso esforço em dominá-lo. Todavia, uma vez que praticamente todo o restante de sua filosofia e ritualística são apresentados por símbolos, pode-se dizer que ela acaba tendo uma correlação muito maior com a psicologia Junguiana. Cada vez que nos valemos de um símbolo ou ritual com intuito de buscar crescimento individual ou passar determinada informação subjetiva, estamos recorrendo direta ou indiretamente a arquétipos que encontram eco na psicologia de Jung.
Evidentemente a Maçonaria é muito mais antiga do que Jung, mas ela naturalmente já recorria a muitas ferramentas as quais nosso irmão Carl Gustaf Jung recorreu, ao buscar entender e sistematizar a psiquê humana. Portanto, julgamos que aqueles que optarem por se aprofundar na visão Junguiana terão grande proveito, tanto para seu próprio crescimento pessoal, quanto para o entendimento mais profundo de muitos dos ensinamentos maçônicos.
Quiron