Retenção maçônica à Brasileira

 Retenção Maçônica
Um resumo à Brasileira

 

No último mês e meio tenho traduzido uma série de artigos americanos e ingleses sobre evasão maçônica e retenção de membros.  Estes posts têm atingido dez vezes mais audiência que os demais, mesmo tendo a mesma divulgação.  Isso deixa claro o quanto o assunto interessa e mesmo preocupa nossos irmãos.  De forma alguma o tema é novidade, já tendo sido abordado em estudos pela CMSB e em vários livros como o do Irmão Mário Vasconcelos. Nossa ordem tem perdido membros e, aqueles que inicia, são cada vez mais idosos. Assim, a Ordem não apenas está encolhendo, como envelhecendo muito rapidamente.

Como se observa pela série de traduções, a questão não é apenas brasileira, mas certamente temos nossas peculiaridades. Neste post pretendo resumir as ideias desta série, organizando-as e dando uma perspectiva brasileira a elas.  Falaremos de captação e depois de retenção de membros; em ambos de maneira sucinta, uma vez que elas foram abordadas nos outros artigos com mais vagar.

 

Captação

Em primeiro lugar é necessário termos em mente que a captação sempre será necessária, pois de qualquer forma sempre haverá um certo nível de evasão por razões normais ou até pelo passamento dos irmãos mais idosos. Outro ponto relevante é termos em mente que nossa captação deve ser baseada naquilo que realmente somos, do contrário, estaríamos não apenas trazendo irmãos que depois se decepcionariam, mas degradando a própria imagem da Maçonaria. Mas que aspectos se destacaram como relevantes na captação de membros ao longo dos artigos que traduzimos? Vamos a eles:

 

Relevância Social

No Brasil, desde a era Vargas, a Maçonaria adotou um perfil mais discreto; talvez até discreto demais. Não se trata de construirmos uma Ordem feita para as aparências, mas de termos uma participação social relevante não apenas de fato, mas relevante na percepção da sociedade. Não é à toa que um dos artigos de maior audiência nesse blog foi a tradução que tinha o título de “se sua loja fechasse amanhã”. O triste fato é que a sociedade pouco perceberia a falta da maioria de nossas lojas.

Outras lojas até fazem relevante trabalho social, todavia esse trabalho é muitas vezes feito apenas no campo financeiro. Talvez devamos intensificar o nosso trabalho também no campo do contato, no campo da verdadeira dedicação de nosso tempo à sociedade ao nosso redor. Além de propiciar maior visibilidade, esse empenho direto de nossos irmãos na benemerência daria aos necessitados o bem mais precioso de todos, que seria nosso tempo e nosso cuidado sincero. Destes atos viria o justo reconhecimento social a uma natural procura da iniciação  por aqueles que se harmonizassem com estes objetivos.

 

Eventos sociais abertos

Quem em sã consciência pede entrada em um grupo sobre o qual nada conhece sem qualquer tipo de informação real sobre a quem está se unindo? Da mesma forma, como aprovamos um profano que não conhecemos tendo apenas ouvido o que outros irmãos falaram dele?

É importante que as lojas tenham eventos nos quais recebam seus amigos, para que surja a natural confraternização entre eles; não o interesse apenas na iniciação, mas o mútuo conhecimento que permitirá uma escolha consciente tanto por parte do candidato quanto por parte da loja.

 

Boa sindicância

É fato que a Maçonaria muitas vezes atrai homens que a buscam por razões não tão nobres. Também acontece de pessoas, ainda que bem intencionadas, buscar a Maçonaria pelas razões erradas ou devido a um engano de percepção. Este tipo de coisa pode, e deve, ser sanada numa boa sindicância, que permita aos irmãos conhecer adequadamente o candidato não apenas em buscas de falsos motivos, mas principalmente da adequação entre o desejo do candidato e aquilo que a fraternidade de fato pode lhe oferecer.

A sindicância não pode ser feita de maneira acelerada somente para cumprir o protocolo. Ela deve ser séria e ter alocado o tempo que for necessário. De nada nos adianta encher as lojas de elementos inadequados. É necessário que o candidato não apenas tenha os objetivos corretos, mas até mesmo que esteja no momento adequado de sua vida a fim de que possa dar à Ordem a atenção necessária, bem como arcar com os custos que ela necessariamente tem. Em resumo, temos que iniciar apenas a pessoa certa, na hora certa. Do contrário, é um desserviço ao iniciado e à Ordem.

 

Sermos, de fato, exemplos

O maior cartão de visitas da Maçonaria são os próprios maçons! Não há maneira de se despertar o interesse de bons homens sem que tenhamos dentro da Ordem homens justos. Certamente o ser humano é imperfeito por definição, mas o maçom deve se destacar no seu grupo pela sua conduta. O respeito a este princípio tem 2 vertentes. Na primeira, cabe à Ordem policiar seus membros, orientando, ajudando e, em último caso, excluindo quando o comportamento não for adequado.  Se a Maçonaria não for de fato um grupo de honra, nenhum homem honrado desejará ser parte dela.

A segunda vertente é mais sutil. Devemos levar à sériono dia-a-dia, o termo Irmão pelo qual tratamos uns aos outros. Em meio a esta grande pandemia, se por um lado vimos grandes mostras de solidariedade, em outros casos vimos afastamento dos irmãos e um quase desinteresse de uns pelos outros. O tratamento entre os maçons deve ser efetivamente aquele de irmãos; que se ajudam, se apoiam, se orientam e também se cobram, sempre alinhados com os ideais da instituição.

 

Retenção

Muito bem. Conseguimos trazer para dentro da Ordem os bons homens e agora temos a obrigação de fazê-los melhores. Mas como mantê-los dentro da Ordem?

Entregar o que promete

Este fundamento parece óbvio, mas nem sempre o levamos totalmente a sério. Não podemos falar uma coisa ao candidato e depois, na prática, não a executarmos em loja. Assim, devemos ficar atentos para de fato cumprir aquilo que falamos ao candidato nas conversas iniciais e, principalmente, na sindicância.

 

Atender às quatro vertentes

Outro ponto chave da retenção Maçônica é atender aquilo que eu chamo de as 4 vertentes de uma loja. Estas são 4 linhas de trabalho que precisam estar todas presentes em uma loja que trabalha de maneira consistente e saudável. Vamos a elas:

1- Ritualística

Com certeza desnecessário mencionar aqui a importância e beleza singular de um ritual maçônico bem conduzido. É importante que nossas lojas não se deixem cair na rotina e mantenham presente o esforço para cumprir nossos rituais da maneira mais correta e brilhante possível.

Todavia, não basta que o novo iniciado veja o ritual correto e o respeito aos nossos usos e costumes. É necessário que ele entenda o porquê de cada um dos componentes deste ritual. Como qualquer cerimônia, nossos rituais sem seus significados tornam-se apenas coreografias vazias. É essencial que o novo iniciado seja instruído no profundo e importante valor simbólico de cada uma das pequenas coisas que compõem o belo antigo e tradicional ritual maçônico.

Para isso é necessário que nossas lojas designem irmãos adequados ao exercício das funções. Que eles possam não apenas executar as cerimônias corretamente, mas orientar os iniciados nas ações de cada uma das coisas.

 

2- Benemerência

Já falamos da benemerência ao trazermos a necessidade de que a loja desempenhe seu papel social para ser vista e, consequentemente, atrair os membros adequados. Repetimos esse tópico aqui apenas para lembrar que isso deve continuar sendo feito não apenas como uma forma de entregar aquilo que prometemos, mas principalmente como forma de instrução e evolução moral e espiritual de nossos membros.


3- Estudo 

Este é um ponto que atrai muitos dos novos membros Todavia, muitas vezes esse aspecto é abordado de maneira superficial ou limitada em algumas oficinas. Também é preciso lembrar que o estudo no simbolismo maçônico não acaba no grau de mestre; prossegue nos graus filosóficos, com a apresentação de trabalhos e estudos mesmo em loja simbólica.

É necessário que nossas lojas apresentem a seus membros um programa de estudos organizado e sério, que de fato agregue algo ao profano que adentrou à Ordem. Para isso, é importante que as lojas disponham de um material de apoio  adequado, numa linguagem apropriada e com referências, para orientar o aprofundamento do estudo do iniciado.


Não queremos dizer aqui que todo iniciado maçom deve ter um conhecimento profundo, quase um mestrado acadêmico, como parte de sua ascensão normal dos graus. Contudo, é importante que possamos dar suporte àqueles que gostam de estudar, viabilizando que cada irmão progrida na vertente para a qual tem maior pendor. Noutros tempos talvez uma loja pequena ou isolada tivesse dificuldade em ter acesso a este tipo de material, mas em nossos tempos de internet está muito mais fácil reunir informações de apoio para um estudante maçônico.

 

4- Verdadeira Irmandade

 Aqui devemos voltar ao aspecto da verdadeira irmandade que já havíamos mencionado quando tratávamos da captação. Se na oficina a benemerência externa é importante, a benemerência para com os irmãos é essencial. E neste caso, a doação de tempo de apoio e de compreensão é muitíssimo mais importante do que a benemerência financeira. Não que ela não possa ter seu lugar no momento adequado.

É importante que sejamos irmãos de fato e em verdadeiro pé de igualdade dentro da loja. Cada membro deve expressar a real preocupação com seus irmãos a fim de poder conhecê-lo e prestar o verdadeiro apoio fraternal quando este se fizer necessário. Aqui reitero, mais uma vez, ser muito mais importante o apoio pessoal do que o material.

Não existe grupo de seres humanos que não venha a ter eventualmente divergências e desentendimentos. Neste momento é importante a reunião do todo da loja, para que os irmãos litigantes possam colocar suas posições, entenderem um ao outro e se pacificarem de fato. Nosso mote de “passar a trolha” é absolutamente essencial para a saúde de uma loja.

 

Acompanhar as mudanças

 Nada no universo é eterno, exceto a própria mudança!  Talvez possa parecer contraditório para alguns irmãos falar de acompanhar as mudanças nos referindo à uma fraternidade tão antiga quanto a nossa. Não estamos aqui defendendo uma heresia ou a subversão daquilo que é a Maçonaria. Todavia, num universo em mudança, aquilo que não muda está fadado à extinção. É evidente que a Maçonaria jamais poderá abrir mão de seus valores, de sua finalidade, de sua moral. Porém, a forma como esse conjunto de valores é transmitido pode e deve acompanhar os tempos modernos.


Como exemplo podemos mencionar o grande sucesso que diversas lojas tiveram com sessões de instrução conduzidas online. Os membros mais jovens nasceram com a internet e a eletrônica à sua disposição, vivendo em um mundo extremamente acelerado. Poder disponibilizar pelo menos parte das atividades desta forma torna mais viável e natural, para a nova geração, a sua manutenção na Maçonaria.  

Obviamente a ritualística presencial sempre terá seu espaço e sua importância. Até mesmo porque este membro mais jovem deve aprender a desacelerar em certos momentos para poder apreciar a vida e sedimentar a sua própria consciência. Como dissemos, não se trata de abrir mão dos valores, mas de adaptá-los para serem transmitidos às novas gerações da melhor maneira.

 

Mas e a administração e politica maçônica?

 Sim, a Maçonaria existe em um mundo real e tem a necessidade de efetuar atividades administrativas e de ter sua própria política interna a fim de dirigir a Ordem. Todavia, creio que todos os leitores concordam que estas atividades devem ser consequência e não objetivo de vinculação Maçônica. Todos nós podemos citar uma série de episódios nos quais funções administrativas ou políticas subiram à cabeça de irmãos, trazendo consequências danosas à nossa fraternidade. É importante que nossos novos membros entendam que essas atividades são necessárias, mas tenham sempre em mente que elas são secundárias e temporárias por natureza. “Lembra de homem que és pó e ao pó retornarás”.

 

Conclusão

 Ao concluir esse trabalho de síntese daquilo que trouxemos neste blog sobre captação e retenção Maçônica preciso deixar claro que tudo o que aqui foi colocado é opinião individual deste autor e, como tal, falha por definição. Não me considero sábio ou experiente para de maneira isolada diagnosticar conclusivamente um fenômeno tão complexo. Desejei apenas trazer aqui aquilo que reuni no processo de produção dos artigos e dar minha visão pessoal para que possa, quem sabe, inspirar outros irmãos para que juntos encontremos a real solução adequada à nossa realidade nacional e de nossas lojas.

Como conclusão final deixo as 4 ideias que julgo terem saltado aos olhos em todo esse processo. São elas:

  • Sejamos fiéis aos nossos ideais
  • Desempenhemos com vigor nosso papel social
  • Fortaleçamos a vertente de estudo e ritualística de nossas lojas
  • Estejamos atentos para evoluir sem  perder os ideais

 

Que o Grande Arquiteto do Universo permita que este trabalho possa reforçar as colunas de alguma loja nesse nosso imenso Brasil.


Autor: Paulo Maurício M. Magalhães

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